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quarta-feira, janeiro 18

 

A vida tal como a penso

Mais uma vez acordei estremunhado. Persegue-me o sonho de sempre: a pura insatisfação do presente, das formas como penso desejar em que o meu presente se transfigure, em qualquer outra coisa. Loucos sonhos de um individuo em pleno êxtase e sedento de uma realização pessoal. Sonho com o que nunca virá, com o que nunca se realizará. Porque não? No mínimo a resposta é simples: nada faço por isso…
E se fizer? Demanda com todas as minhas forças na procura do sonho, do caminho, de uma auto-realização. E se começar a acreditar que posso mudar algo ou alguém? E se acreditar que a forma do mundo pode depender do modelo que lhe quero dar? Continuará a ser uma esfera? Continuará a girar em torno do astro Pai?
Procurei a palete do arco-íris para, com sorte, colorir o mundo de outras tonalidades. Acreditei que o horizonte das nossas singulares vivências podia ser transfigurado em, supostamente, algo melhor. Procurei sair do círculo da minha existência e observar outros, no mais alargado plano a que poderia aspirar. Calcorreei os trilhos que me levam a ti. Pois é por ti que luto e escravizo a minha liberdade. Em ti me quero perder, para me encontrar como, no mínimo, aspiro a ser. Devaneios de um sonhador em desespero de causa…
Pinto o que vejo conforme as diferentes disposições que vou sentindo. A triplicidade de critérios é simples: se descontente com o tempo que não me sorri, optarei por tonalidades negras da realidade a retratar, onde os brancos apenas surgem enquanto esperança, pouca, de uma mudança a surgir; se contente e motivado com o tempo que há-de vir, invento o maior número de matizes possíveis, enquanto expressão de uma transversal alegria de viver o momento que transborda os limites de uma efémera existência; mas, e diga-se em prol da mais pura verdade, aquele em verdadeiramente vivo, posso chamar o tempo real, por entre tonalidades cinzentas e rosas. Impõem-se uma elucidação dos termos agora expostos. Porquê? Pela mera necessidade de uma visão da vida tal como ela é, ou, pelo menos, como penso que ela é.
Em cinzentos reinos nos movimentamos, nunca sabendo ao certo qual a certeza dos caminhos que trilhamos. Logicamente, se é que podemos acreditar na mesma, indeferimos inúmeras direcções, por simples oposição ao que tomamos. Aqui poderá consistir a nossa suposta liberdade de opção: entre muitos, definimos aquele que se afigura como o melhor curso existencial, e se estamos naqueles dias, os mais habituais, seguimos por aí, não por certeza de um espírito iluminado, mas tão simplesmente porque temos de seguir por algum lado. O critério da necessidade impõe-se à nossa consciência, seja ela o que for.
Do fluido rosa se reveste tudo aquilo que gostaríamos que fosse. Ainda que trilhemos um caminho, mais ou menos certos que supostamente seria por aí, devaneamos por entre gostosas utopias, que vão à plena concretização da opção tomada, como a sensação ilusória que outros rumos poderiam ser tomados. E deleitamo-nos a pensar no que o nosso pavio de vela poderia ser: como arderia se o tivesse sido acendido desta forma… ou daquela. Adornamos as hipotéticas escolhas que nunca foram, e rosamos os resultados: teria sido tão bom desta forma… ou nos convencemos que os resultados do itinerário tomado nos irão irremediavelmente conduzir a algum lado. E assim nos deixamos ficar nos rosados resultados de uma acção empreendida. Vale mais aqui o sonho, do que a efectividade de um resultado existencial, dito na crueza das palavras simples, preterimos a acção a tomar em prol de um resultado incerto e “rosado” em que acreditamos.
Este é o meu sonho. Este é o meu pesadelo!!!

Francisco d’Almeida

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